19.6.08

Notas - Shyamalan , Farrell, Allen...

. Se ao falar do novo filme de Shyamalan eu me referi a uma depuração no sentido de se atingir o essencial ao diretor, talvez eu não tenha deixado claro que este não é um processo de concisão formal, muito pelo contrário, o romantismo caro ao diretor dá vazão a uma encenação por vezes hiperbólica que, no decorrer do filme, evolui até atingir o paroxismo na cena em que Mark Wahlberg e Zooey Deschanel caminham e se reencontram em meio a insondável possibilidade de morte. Quando falo em dignidade, me refiro justamente aos riscos que o diretor toma de forma bastante consciente em busca de soluções visuais – e especialmente rítmicas – que abarquem o sentimentalismo exacerbado de seu projeto de cinema. Daí nascem momentos belíssimos e outros de grande inconsistência em toda sua obra, mesmo nos filmes mais acertados, como acredito ser o caso de “Corpo Fechado”, “Sinais” e “A Vila”.

. Querem saber qual é a maior prova de que “O Sonho de Cassandra” é uma obra-prima de contenção? Woody Allen conseguiu transformar Collin Farrell em um ator capaz de tornar seu personagem crível sem qualquer sobressalto. O naturalismo de boutique que marca suas atuações – mesmo em grandes filmes como “Miami Vice” – é prontamente afastado, talvez por ter-se conseguido, finalmente, encontrar um personagem adequado: inseguro, hesitante e completamente incapaz de controlar seus gestos no crescendo neurótico que o filme pontua com perfeição. Não se trata mais da risível dissimulação de uma postura impossível porque eminentemente física, como ocorria em qualquer de suas atuações pregressas, mas justamente o contrário, um esforço em se afirmar justamente por suas fragilidades e incongruências. Este é apenas um dos pequenos milagres que fazem de “O Sonho de Cassandra” uma preciosidade capaz de empalidecer quase toda a produção contemporânea e boa parte dos filmes do próprio Allen. Rigor absoluto de encenação, dramaturgia e ritmo. Trata-se, de certa forma, do oposto lógico de “Fim dos Tempos”; um trágico conto moral incisivo e exato em todos os seus detalhes.

Nenhum comentário: